Em razão da informalidade, a dissolução da união estável ocorre de forma muito simplista, basta uma das partes reivindicar o fim do relacionamento e a união está desfeita. Não há qualquer tipo de burocracia ou procedimento administrativo. É dizer que se assemelha ao namoro, cada um recolhe a trouxinha de roupa e os pertences que deixou na casa do outro e vai embora para a sua casa, ou seja, vida que segue.
O problema se inicia quando, em rol exemplificativo: 1) uma das partes não tem para onde ir, 2) fruto deste relacionamento há filhos menores; 3) a mulher deixa de trabalhar para cuidar da família e dos filhos menores; 4) o casal durante a união estável, em razão do trabalho, adquire bens móveis (carro, moto, aplicações financeiras, joias, etc.) e bens imóveis (apartamento, casa, casa de veraneio, salão comercial, etc.); 5) os conviventes são sócios de empresa; 6) os companheiros recebem dinheiro ou bens em razão de herança da família e revertem em bem imóvel ou móvel na constância da união; 7) um dos companheiros ou ambos já detém patrimônio antes do início da relação, etc.
E o problema surge justamente porque a união estável em razão da informalidade não fixa um termo inicial e final do relacionamento, tão pouco os conviventes se preocupam na escolha de bens que regerá toda a união.
Pensemos no seguinte exemplo: Maria inicia namoro com João em 01/01/2016. No primeiro ano de namoro, em 01/01/2017, Maria e João resolvem alugar um apartamento para morarem juntos. Para João, o fato de morar junto com Maria configura o início da união estável. Já para Maria, o fato de morarem juntos é apenas mais uma etapa do namoro, com o objetivo de se conhecerem melhor. No segundo ano do relacionamento, em 01/01/2018, Maria compra um imóvel com dinheiro adquirido fruto de seu trabalho e ambos se mudam para o novo apartamento. Dois meses após a compra do bem imóvel, 01/03/2018, Maria e João terminam o relacionamento.
Conforme exposto, para João, o início da união estável ocorre a partir do momento em que eles passam a residirem sob o mesmo teto. Já para Maria, o fato de ambos terem alugado um imóvel para morarem juntos era mais uma etapa do namoro, nada mais que isso.
Pergunta-se: Quem está certo, João ou Maria? Qual é o início da união estável?
Se você entender que João está certo, ou seja, que o início da união estável começou quando ambos alugaram o imóvel, o apartamento comprado por Maria (fruto do dinheiro que recebeu e guardou ao longo dos anos em razão do seu trabalho) será partilhado em 50% para Maria e 50% para João, pois na união estável informal vige o regime de comunhão parcial de bens, ou seja, todo patrimônio adquirido ao longo da união, via de regra, deve ser partilhado em 50-50 entre os conviventes independentemente de quem tenha adquirido o bem, pois presume-se que o esforço é comum, ainda que o imóvel tenha sido comprado somente com dinheiro de Maria.
De outro lado, se você entender que Maria está certa, ou seja, que o relacionamento entre eles era apenas um namoro, não há que se falar em partilha de bens, logo, o imóvel adquirido por Maria é somente dela.
Essa briga, com certeza, será levada ao Poder Judiciário e depois de longos anos de discussão para saber quem está certo ou errado, sobretudo, em razão da morosidade da Justiça brasileira, será proferida uma sentença em favor de um ou de outro.
Haverá aqui um verdadeiro desgaste emocional entre todos os envolvidos e muito dinheiro gasto com honorários de advogados para defesa de seus clientes.
Para evitar esta situação desagradável, a escritura pública de união estável se mostra como um verdadeiro instrumento para resguardar os interesses das pessoas que vivem em união estável.
Isso porque, neste instrumento é possível pactuar o início da união estável, o regime de bens e todas as regras que vigerão durante a união, evitando, assim, qualquer dissabor futuro na dissolução de união estável.
É possível, por exemplo, determinar na escritura pública o regime de separação convencional de bens invés do regime de comunhão parcial de bens, ou seja, numa dissolução sob o regime de separação de total de bens, os bens adquiridos pelo companheiro permanecem com o companheiro, os bens adquiridos pela companheira permanecem com a companheira e os bens adquiridos em conjunto serão divididos de forma proporcional de acordo com o esforço de cada convivente.
Mais que o aspecto patrimonial, a escritura pública de união estável permite resguardar os direitos a serem adquiridos pelo companheiro, no qual podemos destacar, também em rol exemplificativo: inclusão do companheiro em planos de saúde, clubes, pensão por morte, seguro de vida, meação e herança de bens, pensão alimentícia compensatória, direito real de habitação do convivente sobrevivente, etc.
Imagine, por exemplo, que você tenha um patrimônio determinado, há investimentos, contribui com o INSS para aposentadoria, paga previdência privada, etc., mas que sua família não goste do seu companheiro. A união estável entre vocês é regida pela informalidade e, em certo momento da união, você é acometida por uma doença e morre.
Já imaginou a dificuldade do seu companheiro para acessar o INSS para receber seguro por morte em razão do seu falecimento? Ou para ter acesso aos seus investimentos nas instituições financeiras, etc.?
E se seus familiares na ação de inventário excluírem seu companheiro da herança sob justificativa de que vocês apenas namoravam?
Como ficam os direitos de seu companheiro em razão de sua morte?
Mais uma vez a escritura pública de união estável se mostra como instrumento para resolver ou, ao menos, mitigar eventuais transtornos que podem ocorrer em desfavor de seu companheiro em razão da informalidade que rege a união estável.
Uma vez convencido ou convencida da importância da escritura pública de união estável, o próximo passo é responder a seguinte pergunta: Como que eu faço uma escritura pública de união estável?
Em resposta simplista, a escritura pública é realizada por meio do Tabelionato de Notas. Há modelo padrão que o cartório disponibiliza às pessoas que o procuram. Também é possível encontrar alguns modelos na internet.
A próxima pergunta é: O modelo disponibilizado pelo Cartório ou disponibilizado na internet é confiável?
A resposta é NÃO. O modelo de um documento, nada mais é do que transcrição genérica de algo que, na grande maioria dos casos, não atende suas necessidades, justamente porque esses modelos não cuidam das especificidades do seu caso concreto.
Você não é cliente do Tabelionato de Notas, você é apenas um cidadão - usuário - que se vale da fé pública que é conferida ao tabelião para dar publicidade a determinado documento perante terceiros. Não é papel do Tabelião assessorá-lo juridicamente, tal como faz o advogado. Estando o documento minimamente em ordem, ainda que nada diga a respeito das suas especificidades, o tabelião irá confeccionar o documento e dar fé pública, nada mais que isso.
O advogado, por sua vez, especializado em direito de família, irá aconselhá-lo e assessorá-lo juridicamente diante das suas especificidades, traçará contigo uma estratégia e abordará todos os pontos para redigir uma minuta de escritura pública completa que se adeque a sua realidade, entregando, via de regra, ao Tabelião ou ao próprio cliente que se encarrega de levar a minuta até o Tabelião para dar fé pública ao documento.
Por isso, não se deixe levar pelos modelo disponibilizado nos Tabelionatos ou mesmo nos documentos acessíveis pela internet, pois são documentos padrões que, na prática, não atendem as especificidades do caso em contrato, seus desejos e intenções.
De fato, abordar o assunto para assinatura de uma escritura pública de união estável não é agradável quando estamos à discutir sobre patrimônio, mas quando você considera o que você tem a perder numa eventual dissolução, pode ser uma conversa que você tenha que ter com seu parceiro principalmente sobre a escolha do regime de bens.
Ao ter que tomar grandes decisões em sua vida, por certo você quer ter as melhores opções possíveis disponíveis para você, portanto, é um eufemismo ainda maior dizer que a escolha do advogado é muito importante.
AVISO LEGAL: Este artigo fornece apenas informações genéricas e não pretende ser aconselhamento jurídico e não deve ser utilizado como tal. Se você tiver alguma dúvida sobre seus assuntos de direito de família, entre em contato com o nosso escritório.