Em que pese essa facilidade para divorciar diante da evolução jurídica e social, o casamento ainda é um instituto sólido que estabelece o vínculo conjugal, com base na igualdade de direitos e deveres do casal.
Nesse sentido, em atenção ao preceito monogâmico do casamento, a legislação prevê a fidelidade recíproca, respeito e consideração mútuos como deveres de ambos os cônjuges. Igualmente, a legislação prevê o adultério como uma violação aos deveres do casamento e motivo que pode caracterizar a impossibilidade da comunhão plena.
Considerando que infidelidade viola a expectativa de construção de uma vida em plena comunhão, fundada na convivência monogâmica e exclusividade da relação conjugal, o Poder Judiciário tem recebido ações judiciais com pedidos de indenização por danos morais sob o fundamento da traição, ou seja, indenização pelo descumprimento da fidelidade durante o casamento.
No entanto, há entendimento pacificado nos Tribunais que no plano da indenização por dano moral, como regra geral, não basta o fato em si, o acontecimento, como no caso da traição, mas, sim, a prova de sua responsabilidade civil.
Nesse sentido, o Tribunal de Minas Gerais assim decidiu:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INFIDELIDADE CONJUGAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. A violação aos deveres conjugais, inclusive a infidelidade conjugal, não constitui, por si só, ofensa à dignidade da pessoa humana, nem tampouco à honra da vítima, não gerando o dever de indenização, sendo necessária a prova do ato lesivo à honra. (TJ-MG - AC: 10000191238955001 MG, Relator: Pedro Bernardes, Data de Julgamento: 18/11/2020, Câmaras Cíveis / 9ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 18/11/2020)
Com efeito, para essa corrente jurisprudencial, para que se possa falar em indenização por dano moral, é preciso que a pessoa seja atingida em sua honra, sua reputação, sua personalidade, seu sentimento de dignidade, passe por dor, humilhação, constrangimentos, tenha os seus sentimentos violados.
Nessa linha de raciocínio, a prática da infidelidade, embora moralmente reprovável, é circunstância de cunho pessoal, não prevendo a lei sanção pela sua violação.
Daí porque o direito à indenização em razão da infidelidade conjugal só nasce quando faz com que o outro cônjuge passe por sofrimento excessivo, humilhação ou constrangimentos que vão além da mágoa, tristeza e até mesmo a desestruturação familiar relativas ao término da união.
Nesse sentido, o Tribunal do Distrito Federal assim decidiu:
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL. INFIDELIDADE CONJUGAL. PROVA. OFENSA A ATRIBUTO DA PERSONALIDADE. DANO MORAL CONFIGURADO NO CASO. 1. O simples descumprimento do dever jurídico da fidelidade conjugal não implica, por si só, em causa para indenizar, apesar de consistir em pressuposto, devendo haver a submissão do cônjuge traído a situação humilhante que ofenda a sua honra, a sua imagem, a sua integridade física ou psíquica. Precedentes. 2. No caso, entretanto, a divulgação em rede social de imagens do cônjuge, acompanhado da amante em público, e o fato de aquele assumir que não se preveniu sexualmente na relação extraconjugal, configuram o dano moral indenizável. 3. Apelação conhecida e não provida. (TJ-DF 20160310152255 DF 0014904-88.2016.8.07.0003, Relator: FÁBIO EDUARDO MARQUES, Data de Julgamento: 21/03/2018, 7ª TURMA CÍVEL, Data de Publicação: Publicado no DJE : 26/03/2018 . Pág.: 415-420)
Nessa mesma linha, o Tribunal de São Paulo condenou o marido em razão dele ter traído a esposa na residência do casal.
Consta nos autos que a autora, já desconfiada da infidelidade, solicitou aos vizinhos imagens das câmeras das residências e descobriu que o então marido havia levado outra mulher para a casa do casal, onde eles moravam com os filhos. Ela alegou que a circunstância ocasionou enorme angústia e desgosto.
O relator do caso destacou que a simples traição ou relação extraconjugal não ensejaria indenização por danos morais, no entanto, o dever de reparar advém "da insensatez do réu ao praticar tais atos no ambiente familiar, onde as partes moravam com os três filhos comuns".
De outro lado e não menos importante a jurisprudência ainda possui entendimento que a reparação por dano moral em razão da infidelidade não se estende ao cúmplice de traição a quem não pode ser imputado o fracasso da sociedade conjugal.
RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL. DANOS MATERIAIS E MORAIS. ALIMENTOS. IRREPETIBILIDADE. DESCUMPRIMENTO DO DEVER DE FIDELIDADE. OMISSÃO SOBRE A VERDADEIRA PATERNIDADE BIOLÓGICA DE FILHO NASCIDO NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO. DOR MORAL CONFIGURADA. REDUÇÃO DO VALOR INDENIZATÓRIO. [...] 3. O dever de fidelidade recíproca dos cônjuges é atributo básico do casamento e não se estende ao cúmplice de traição a quem não pode ser imputado o fracasso da sociedade conjugal por falta de previsão legal. [...] (STJ - REsp: 922462 SP 2007/0030162-4, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 04/04/2013, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 13/05/2013)
Por fim, vale lembrar que esse mesmo entendimento aplicado nas relações advindas do casamento também pode ser aplicado na hipótese de união estável.
A ideia é a mesma, qual seja: a indenização em razão da infidelidade de um dos conviventes se configura quando o convivente traído é exposto a situação humilhante que ofenda a sua honra, a sua imagem, a sua integridade física ou psíquica.
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