Jurisprudência Lotérica no Direito de Família

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Angelo Mestriner
Direito Processual / Jurisprudência
Última atualização:13 jun. 2022
Escrito por:

A jurisprudência lotérica é considerada por muitos o terror dos litigantes, mas, o que, de fato, quer dizer jurisprudência lotérica?

Jurisprudência lotérica é um termo utilizado para designar decisões antagônicas proferidas por juízes ou julgadas de maneira diferente sobre uma mesma matéria. Nessa ordem de ideias, a decisão proferida pelo juiz é dada mais pela consciência do magistrado (interpretação subjetiva, pessoal) do que pela interpretação propriamente dita da lei.

Assim, se a parte tiver a sorte do processo ser distribuído para um juiz que tenha entendimento favorável sobre a matéria levada ao Poder Judiciário, o jurisdicionado terá reconhecido o direito pleiteado, do contrário, será negado a tutela pretendida.

O Código de Processo Civil, que entrou em vigor no ano de 2015, trouxe alguns artigos de lei que buscam uniformizar a jurisprudência, empreendendo esforços para mantê-la estável, íntegra e coerente. Trata-se de uma preocupação do legislador com a segurança jurídica e igualdade entre os jurisdicionados, no intuito de afastar, combater a jurisprudência lotérica.

No entanto, malgrado esse esforço legislativo para combater a jurisprudência lotérica, no âmbito do direito de família, ela ainda assim continua mais viva do que nunca.

Exemplo de jurisprudência lotérica pôde ser percebido nas ações judiciais de regulamentação de visitas durante a pandemia do Covid-19, onde, dentro de uma mesma matéria, parcela de juízes se dividiram entre, de um lado, suspender as visitas do pai diante das medidas restritivas aplicadas pelos Estados e, de outro lado, autorizar a manutenção das visitas mesmo diante das medidas restritivas aplicadas pelos Estados.

Vejamos:

(Decisão que autorizou o convivência presencial entre pai e filho)

DIREITO CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PEDIDO DE SUSPENSÃO DAS VISITAS DO PAI À FILHA DURANTE A PANDEMIA DE COVID-19. RISCO DE CONTÁGIO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTOS. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA. DECISÃO MANTIDA. 1. Segundo o ordenamento jurídico pátrio, a guarda será definida atendendo aos interesses da criança, segundo o art. 1.583 e seguintes do Código Civil, devendo-se priorizar a modalidade compartilhada, em razão da importância que ambos os pais exercem na formação do filho. 2. A suspensão das visitas do genitor ao filho é medida que deve ser tomada com a máxima prudência e requer robustos elementos de convencimento. 3. Constatado nos autos a inexistência de risco para a filha e avós maternos, porquanto o pai, médico, não cuida de pacientes infectados pelo coronavírus, não há justa razão para impedir as visitas à menor. 4. Agravo de Instrumento conhecido, mas não provido. Unânime. (TJ-DF 07081973320208070000 - Segredo de Justiça 0708197-33.2020.8.07.0000, Relator: FÁTIMA RAFAEL, Data de Julgamento: 19/08/2020, 3ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no PJe : 01/09/2020 . Pág.: Sem Página Cadastrada.)

(Decisão que suspendeu a convivência presencial entre pai e filho)

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. VISITAS PATERNAS. SUSPENSÃO TEMPORÁRIA. PANDEMIA COVID-19. Sem descurar a importância da convivência paterno-filial, que, no caso, foi ajustada provisoriamente pelos contendores em janeiro do corrente ano, não se pode ignorar a atual e delicada situação vivenciada com a pandemia de COVID-19. O contexto fático atual é diverso daquele existente quando houve o acordo provisório acerca das visitas paternas. De mais a mais, é inquestionável que os profissionais da área da saúde (no caso, o agravante é médico), que atuam em hospitais e unidades que efetuam atendimento de pacientes provavelmente infectados, estão mais expostos ao contato com o vírus. Prudente, então, preservar o melhor interesse do infante, prestes a completar 3 anos de idade, frente à situação excepcional enfrentada pela população mundial.Manutenção da decisão agravada, que suspendeu temporariamente as visitas paternas presenciais.NEGARAM PROVIMENTO, POR MAIORIA. (TJ-RS - AI: 70084129725 RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Data de Julgamento: 28/05/2020, Oitava Câmara Cível, Data de Publicação: 09/06/2020)

Como se nota, os dois julgados foram proferidos no início da pandemia, os pais eram médicos e, segundo consta nos julgados, nenhum deles cuidava diretamente de pacientes infectados pela COVID, contudo o Tribunal do Rio Grande do Sulsupôs que o fato do pai ser médico e possivelmente ter contato com pacientes provavelmente infectados (supostamente mais exposto ao vírus) já seria suficiente para suspender temporariamente as visitas presenciais entre o pai e o filho.

Em outras palavras: Os casos apontados na jurisprudência destacada possuem similitude fática, mas foram julgados de forma diversa, restando evidente a jurisprudência lotérica no caso analisado.

De outro lado, também é possível perceber jurisprudência lotérica na mesma Câmara do Tribunal, como, no caso, abaixo analisado.

Vejamos:

(Decisão que autorizou o convivência presencial entre pai e filho)

(...) Cabível a pretensão de visitação, não obstante o evento COVID 19, uma vez que a mãe certamente empreenderá todos cuidados que a etiqueta médica recomenda para preservar a saúde da criança. Devida a adequada convivência da mãe e filha, de forma pessoal e não somente virtual para o período do COVID-19, já que a mãe permanecerá neste período na cidade de residência da criança. Postas estas considerações, a fim de preservar a necessária convivência entre a mãe e filha, deve ser regulamentada a retirada da filha para sábados, alternados, pegando-a às 10 horas e devolvendo-a no domingo às 18:00 horas, conforme o pedido subsidiário. (...) (TJ-RS - AI: 00522856220208217000 PORTO ALEGRE, Relator: Carlos Eduardo Zietlow Duro, Data de Julgamento: 15/04/2020, Sétima Câmara Cível, Data de Publicação: 17/04/2020)

(Decisão que suspendeu a convivência presencial entre pai e filho)

(...) O decisum está em alinho com as determinações governamentais de isolamento social, em virtude da pandemia de covid-19, sendo prudente que a visitação presencial seja, por ora, suspensa. Ainda que não haja qualquer indicação de que o agravante possa descumprir as determinações de isolamento social, deve-se ponderar, na atual conjuntura, não só a proteção à saúde de seu filho, um de apenas 4 anos de idade, mas, também, o interesse da coletividade em não alastrar a pandemia, com o que é prudente que a visitação presencial seja, no momento, desautorizada. Nada obsta, contudo, que as partes, urbanamente e tomando os cuidados necessários e amplamente divulgados pelos órgãos de segurança, ajustem visitação presencial do genitor, desde que de forma esporádica. Considerando, por outro lado, que a situação instalada se altera a cada dia, ressalto que nova regulação de visitas poderá ser feita pelo juízo de 1º grau, a qualquer tempo, relembrando que a decisão estipulou a visitação virtual até o dia 30/04/2020, apenas. (...) (TJ-RS - AI: 00524597120208217000 PORTO ALEGRE, Relator: Vera Lucia Deboni, Data de Julgamento: 16/04/2020, Sétima Câmara Cível, Data de Publicação: 17/04/2020)

Como se nota nas decisões destacadas há similitude fática dos casos com decisões manifestamente antagônicas.

Em 15/04/2020, no recurso de agravo de instrumento (TJRS - Comarca Porto Alegre - Nº 70084139260 (Nº CNJ: 0052285-62.2020.8.21.7000)) o desembargador relator proferiu decisão reformando a decisão do juízo de primeiro grau para autorizar a convivência presencial da mãe com o filho durante pandemia covid-19.

Já, no outro julgado, em 16/04/2020, ou seja, apenas um dia de diferença, no recurso de agravo de instrumento (Tribunal de Justiça Rio Grande do Sul - Comarca Porto Alegre - Nº 70084141001 (Nº CNJ: 0052459-71.2020.8.21.7000)) a relatora desembargadora proferiu decisão mantendo na íntegra a decisão do juízo de primeiro grau que substituiu a convivência presencial do pai com o filho por virtual durante pandemia covid-19.

As decisões foram proferidas pela mesma Câmara, com apenas um dia de diferença entre elas.

O que se espera no direito de família é que as decisões proferidas salvaguardem o melhor interesse da criança, quando existe menor envolvido nas disputas judiciais, contudo, isso aparentemente não pode ser visto nos julgados analisados diante das decisões manifestamente antagônicas entre si, o que força a reconhecer que a jurisprudência lotérica nas causas de direito de família ainda está mais viva do que nunca, em que pese o esforço legislativo para combatê-la.

Na sequência, deixo registrado os artigos do Código de Processo Civil que objetivam mudar a realidade atual.

Código de Processo Civil

Art. 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente.

§ 1º Na forma estabelecida e segundo os pressupostos fixados no regimento interno, os tribunais editarão enunciados de súmula correspondentes a sua jurisprudência dominante.
§ 2º Ao editar enunciados de súmula, os tribunais devem ater-se às circunstâncias fáticas dos precedentes que motivaram sua criação.

Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:

I - as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;
II - os enunciados de súmula vinculante;
III - os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos;
IV - os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional;
V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.
§ 1º Os juízes e os tribunais observarão o disposto no art. 10 e no art. 489, § 1º , quando decidirem com fundamento neste artigo.
§ 2º A alteração de tese jurídica adotada em enunciado de súmula ou em julgamento de casos repetitivos poderá ser precedida de audiências públicas e da participação de pessoas, órgãos ou entidades que possam contribuir para a rediscussão da tese.
§ 3º Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica.
§ 4º A modificação de enunciado de súmula, de jurisprudência pacificada ou de tese adotada em julgamento de casos repetitivos observará a necessidade de fundamentação adequada e específica, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia.
§ 5º Os tribunais darão publicidade a seus precedentes, organizando-os por questão jurídica decidida e divulgando-os, preferencialmente, na rede mundial de computadores.

Art. 928. Para os fins deste Código, considera-se julgamento de casos repetitivos a decisão proferida em:

I - incidente de resolução de demandas repetitivas;
II - recursos especial e extraordinário repetitivos.
Parágrafo único. O julgamento de casos repetitivos tem por objeto questão de direito material ou processual.


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