Havendo divergência sobre a tomada da decisão conjunta do casal a ponto dos genitores não chegarem a um consenso, inicialmente, é de bom senso, que os ambos os pais da criança busquem amparo junto a família, amigos, comunidade local, sessões de mediações extrajudiciais, sessões de coaching ou mesmo sessões de psicoterapia a fim de que consigam resolver o conflito instaurado amigavelmente, empreendendo esforços para encontrarem a melhor solução para resolverem o conflito em benefício do filho em comum.
Na hipótese do conflito persistir, sob meu ponto de vista, em ultima ratio, abre-se espaço aos órgãos estatais, como o Poder Judiciário, para resolver o litígio instaurado.
De outro lado, verifica-se que as divergências e graves desentendimentos entre os genitores ganham relevo sobretudo na deterioração do ambiente doméstico quando o casal está na iminência de uma separação ou já separados, assumindo consequências ainda maiores quando há disputa entre a guarda judicial dos filhos em meio a separação (divórcio ou dissolução da união estável).
Cumpre esclarecer que a guarda judicial consiste na materialização da posse de fato do menor. No Brasil, há dois modelos de guarda judicial: a guarda unilateral e a guarda compartilhada.
A guarda unilateral, sem levar em considerar a família extensa, é atribuída a uma única pessoa (pai ou mãe) enquanto que a guarda compartilhada é atribuída a ambos os genitores.
A lei brasileira estabelece que quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar que não deseja a guarda do menor.
Contudo, na prática da Justiça brasileira, o que se verifica na maioria das Varas de Família dos estados brasileiros é a atribuição da guarda a apenas um genitor (guarda unilateral), tendo como tendência que, no caso das crianças, o melhor interesse é permanecer sob a guarda da mãe, salvo quando demonstrado que a guarda unilateral causará prejuízo ao desenvolvimento biopsicossocial da criança.
No mesmo sentido, os juízes das Varas de Família não costumam conceder guarda compartilhada aos casais que se separam de forma conflituosa, em que pese o texto da lei atribua como regra a guarda compartilhada mesmo nos casos em que não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, o que pressupõe, de certo modo, o litígio entre os genitores.
Sob este aspecto da guarda judicial, percebe-se que o legislador brasileiro desde o final de 2014 inovou, trazendo uma legislação mais moderna ante a legislação conservadora existente, preocupada com a nova realidade em que os divórcios são mais frequentes, de modo a garantir que ambos os genitores possuam todos os direitos parentais, sobretudo, no que compete o direito de participar ativamente no compartilhamento das decisões em benefício do filho, a semelhança do que acontecia quando os genitores viviam juntos e decidiam em conjunto os assuntos relacionados à prole.
O que se verifica é que a lei da guarda compartilhada em si, por mais justa que seja, não reedita as sequelas da memória da sociedade, na medida que, por séculos, no processo educacional de nossa cultura, fomos ensinados a pensar que a criança tem que ser colocada sob a guarda exclusiva de apenas um genitor quando há a separação do casal.
E aqui, que fique claro, não estou defendendo o pai ou a mãe que busca a guarda judicial unilateral, mas expondo uma crítica as decisões judiciais dos tribunais que preferem aplicar a guarda judicial unilateral 'como regra' mesmo havendo uma lei que estabelece o contrário quando se identifica que ambos os genitores estão aptos a exercerem o poder familiar.
Portanto as decisões que aplicam a guarda judicial unilateral mesmo diante da condição de que ambos os pais estão aptos a exercer o poder familiar põe em rota de colisão com a lei da guarda compartilhada. Com efeito, o pensamento lógico-linear de que a criança será melhor assistida apenas por um genitor demonstra pouca preocupação com a formação da identidade da criança, que tem o direito de ter o pai e a mãe presentes em todos os aspectos mesmo quando separados, não sendo razoável à luz do que objetivamos enquanto humanidade solidária estabelecer a guarda exclusiva a um dos genitores, quando demonstrado que ambos estão aptos a exercer o poder familiar.
Precisamos vencer barreiras do passado e isso dependente de boas doses de educação e reciclagem de pensamentos de todos os envolvidos, aqui em inclusos a sociedade, a família e também os operadores do direito, a fim de que a sociedade moderna busque a integração, a indistinção do núcleo familiar garantindo que ambos os genitores, apto ao poder familiar, exerçam a guarda compartilhada em favor do filho comum.
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